APES divulga Carta Aberta às e aos docentes do IF Sudeste MG e da UFJF

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Juiz de Fora, 12 de julho de 2024.

Prezada(o) Colega,

As universidades e institutos federais desempenham um importante papel no desenvolvimento da sociedade brasileira ao promoverem a formação humana e profissional, a pesquisa científica e tecnológica e a difusão de conhecimentos e saberes, além de contribuírem para o processo de criação e difusão cultural.  Nossas instituições são um patrimônio público decisivo para um projeto de nação.

Nós, docentes, temos uma responsabilidade com as nossas instituições. Com o relevante trabalho do corpo técnico-administrativo e com a efetiva atuação do corpo discente, realizamos um trabalho altamente qualificado, no ensino, na pesquisa e na extensão, para a sociedade brasileira.

Foi em defesa das nossas instituições e pela valorização do trabalho docente que realizamos a greve deflagrada em 15 de abril, reivindicando: i) a recomposição orçamentária; ii) o reajuste salarial; iii) a revisão da nossa carreira; iv) a revogação de medidas que afetam nosso trabalho e o bom funcionamento das nossas instituições; v) o respeito e a valorização de docentes aposentadas(os), que durante décadas se dedicaram à vida institucional.

Compreendemos que a greve no setor público é sempre um recurso extremo, que pode e deve ser acionado diante da ausência de diálogo por parte do governo. Trata-se de uma medida que visa romper com a intransigência governamental para abrir o diálogo sobre medidas necessárias ao fortalecimento institucional e à valorização do trabalho docente.

A pesquisa de opinião da Quaest Consultoria e Pesquisa, publicada no jornal O Globo, em 11 de maio do corrente ano, revelou que 78% da população apoiaram nosso movimento, reconhecendo a pertinência de nossa pauta. Além disso, destacamos que fomos apoiados por setores do movimento estudantil; pela Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES); pelo Conselho Nacional dos Dirigentes das Instituições de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (CONIF); por vários Conselhos Superiores, entre eles o da UFJF e, por fim, por muitos parlamentares. Esse amplo apoio reconheceu que salários justos e condições adequadas de trabalho são fundamentais para que nossas instituições possam atuar para o desenvolvimento da sociedade brasileira, contribuindo com o  futuro do nosso país.

 Nesse sentido, temos certeza de que a greve finalizada no dia 1º de julho poderia ter sido evitada se o governo federal, por meio de seus representantes, tivesse demonstrado efetiva disposição para negociar nossa pauta de reivindicação de forma democrática, reconhecendo a importância de nossas instituições e do nosso trabalho no ensino, na pesquisa e na extensão, para o desenvolvimento do país. Contudo, isso não se efetivou.

A greve viabilizou a retomada da negociação com o governo, mas após 75 dias, com o estabelecimento de um impasse político, a maior parte das assembleias docentes optou por encerrar o movimento e por assinar o termo de acordo com o governo, mesmo reconhecendo que os avanços obtidos ficaram aquém das reivindicações. 

Apesar desse fato, compreendemos que sem a pressão da greve teríamos um cenário muito pior, pelos motivos que passamos a expor:

–  Reajuste salarial:

  • Em 21 de dezembro de 2023, na reunião de negociação, o governo anunciou que teríamos a seguinte escala de reajustes: 0% em 2024; 4,5% em 2025 e 4,5% em 2026. Nessa oportunidade, o governo fez acenos sobre reajuste dos benefícios;
  • Com a greve, chegamos aos seguintes percentuais médios: 9% em 2025 e 3,8% em 2026 (veja a tabela completa). O governo se negou a conceder 3,8% em 2024 para minimizar as perdas acumuladas; 
  • Obtivemos recomposição de cerca de 0,5% na mudança dos níveis da carreira;
  • O governo foi intransigente sobre o tema “reajuste salarial linear”. Nessa direção, partiu para o “tudo ou nada”, isto é, indicou “reajuste por dentro da carreira ou índice de 0%”;
  • Com essa medida, evitou enfrentar o tema da reestruturação de nossa carreira e ainda aprofundou as assimetrias já existentes;
  • Teremos reajustes variados em 2025 e 2026. Como exemplo, podemos citar três casos, totalizando os percentuais de 2025 e de 2026: docentes Adjunto I receberão 13,3%; docentes Associado I receberão 14,3% e Titulares receberão 17,6%.

– Benefícios (alimentação, saúde e creche) :

  • Apesar de acatar a reivindicação de reajuste, o governo não aceitou equiparar os valores dos benefícios aos destinados para o pessoal do poder Legislativo e do poder Judiciário. 

– Orçamento:

  • Reivindicamos a correção orçamentária para garantir o efetivo funcionamento das nossas instituições, contemplando várias despesas de custeio, incluindo a referente à política de assistência estudantil;
  • Obtivemos a liberação de valores orçamentários para o custeio das instituições muito abaixo do reivindicado. Mesmo com o pequeno avanço, muitas universidades e institutos poderão fechar o exercício de 2024 com déficits;
  • O governo anunciou, no dia 10 de junho, a implementação de programa de expansão e de recuperação das instituições do sistema federal de educação – o  chamado “PAC da Educação”. Contudo, não apresentou o projeto e o impacto nas despesas de pessoal (salários!), limitando-se apenas a indicar o valor global que será destinado às obras.

– Revogação de medidas:

  • Apesar de fazer parte da agenda de transição que foi definida após a eleição de 2022, o governo não se movimentou para promover a revogação do entulho normativo deixado pelo governo Bolsonaro;
  • No termo de acordo assinado, o governo se comprometeu revogar a Portaria nº 983/2020 e a Instrução Normativa nº 66/2022; 
  • Especificamente sobre a reivindicação referente ao tema “eleição e nomeação de dirigentes (reitoras e reitores)”, o governo resolveu seguir apostando no projeto de lei nº 2.699/2011, sob a relatoria do deputado Patrus Ananias (PT-MG) emitida em 2023. Também não demonstrou disposição para anular as nomeações dos reitores-interventores designados pelo governo Bolsonaro.

Reconhecemos que o governo está diante de entraves políticos instituídos pelos desdobramentos do golpe de 2016 e sob pressão de três grupos políticos. O primeiro é formado pelos fisiologistas, cuja maior expressão são os parlamentares do chamado “Centrão”, liderados pelo deputado Arthur Lira. O segundo é integrado pela extrema-direita neofascista. O terceiro é constituído pelos neoliberais, que são grandes especuladores que insistem em medidas para sugar o fundo público pela via da financeirização, o que se confirma pela elevada taxa de juros e pelas pressões para cortes dos gastos públicos nas áreas sociais, inclusive na educação. Representantes desse grupo ocupam a direção do Banco Central e cargos no governo.

Contudo, compreendemos que a greve foi um meio político para disputarmos o fundo público, sinalizando para o governo que existe uma agenda de desenvolvimento que não pode ser sufocada por interesses privatistas e elitistas. Sem a greve, o governo não teria agido e os poucos recursos destinados para o reajuste salarial até 2026 e para o orçamento das instituições estariam a serviço de pessoas e organizações que vivem da especulação e da sangria da riqueza nacional.

Cabe ressaltar que os representantes do governo destacados para negociar não demonstraram uma postura respeitosa e democrática nas reuniões das mesas de negociação. Tratando docentes como “inimigos”, tais sujeitos revelaram que o autoritarismo é um câncer político que pode sufocar nossas instituições e, por conseguinte, nosso trabalho, ameaçando o futuro do país.

Diante de tantos desafios, precisamos confirmar nossa existência como categoria profissional comprometida com a defesa das nossas instituições, com a democracia e com o futuro do nosso país. Isso exige uma organização sindical forte!

Sobre esse tema, destacamos fatos que não podem ser esquecidos. Em 2019, as direções do ANDES-SN e da APES, ao lado de outras seções sindicais, lideraram a resistência contra o projeto chamado Future-se e contra o corte de verbas de nossas instituições. Na pandemia, nossas entidades, atuaram junto aos parlamentares para não permitir que nossos salários sofressem um corte entre 10% a 30%. Além disso, em 2021, atuaram para barrar a chamada reforma administrativa, que pretendia, entre outras coisas, acabar com a nossa estabilidade profissional. Ressaltamos que a organização sindical – uma construção coletiva – é o que vem permitindo avanços mesmo em conjunturas adversas.

Diante disso, destacamos que precisamos superar o individualismo e a indiferença, marcas de nosso tempo histórico, para preservar nossas instituições e nosso trabalho.

Por fim, saudamos as(os) docentes sindicalizadas(os) que participaram da greve, que, apesar de ter produzido algo aquém de nossas reivindicações, foi importante na disputa do fundo público. Além disso, convidamos as(os) demais docentes a providenciar a sindicalização na APES, para que ajudem a  fortalecer o esforço coletivo cujos resultados beneficiam a todos.

Com o fortalecimento de nossa organização sindical enquanto categoria profissional, estaremos juntos na construção de saídas para os desafios futuros e para a defesa de nossas instituições e de nosso trabalho dedicado à sociedade brasileira, especialmente a sua juventude.

Diretoria da APES