APES divulga Carta Aberta às e aos discentes do IF Sudeste MG e da UFJF

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  Juiz de Fora, 12 de julho de 2024.

 Prezadas, Prezados e Prezades Estudantes,

 Nós, docentes da Universidade Federal de Juiz de Fora e do Instituto Federal Sudeste Minas Gerais, deliberamos na Assembleia do dia 26 de junho de 2024 pelo encerramento local da Greve, no contexto de saída coletiva do ANDES-SN, e pela retomada do trabalho docente no dia 1o de julho, reivindicando às Reitorias de ambas as Instituições a recomposição integral do calendário acadêmico. Em reconhecimento de que vocês, estudantes, são uma das principais razões de existência de nossas instituições, e de que o movimento grevista traz inevitáveis impactos às esferas individuais, familiares, coletivas, deliberamos, também, por redigir esta Carta. Nas linhas abaixo, nos dirigimos a cada um e a cada uma de vocês, para compartilhar um balanço da Greve de 2024, deflagrada no dia 15 de abril, e para sinalizar a permanência de desafios que reclamam a nossa disposição de luta em defesa da educação pública. 

Razões da Greve. A defesa de um projeto de nação mais justa, igualitária, comprometida com direitos humanos e democracia, levou-nos a lutar contra a extrema direita nas ruas e nas urnas, a denunciar projetos privatistas e elitistas, a reforçar a centralidade da defesa da educação pública, gratuita, democrática, inclusiva, laica e socialmente referenciada. O atual Governo Federal foi eleito nesse contexto e adotou como marca o slogan “Brasil União e Reconstrução”. Não há, porém, reconstrução possível deste país sem a valorização da Educação. Não apenas no discurso, mas no concreto das escolhas, das prioridades, das ações. A educação demanda recursos e nos convoca à disputa pelo fundo público (recomposição orçamentária). Demanda boas condições de trabalho, valorização das categorias profissionais que lhe dão sustentação (carreira/salário), bem como lastro normativo que favoreça seu bom funcionamento (revogação de medidas prejudiciais à educação). Todos esses elementos compuseram ampla pauta de reivindicações encaminhada por nossa categoria, legitimamente representada pelo ANDES-SN, ao atual Governo ainda na etapa de transição. Apenas ao final de 2023, porém, o Governo fez algum aceno para a educação federal, apresentando proposta de reajuste de auxílios de servidoras(es) – sem equiparar aos auxílios recebidos por servidoras(es) dos Poderes Legislativo e Judiciário –, bem como proposta de reajuste salarial – 0% para 2024, 4,5% em 2025 e 4,5% em 2026 (seria necessário índice de 22,71% de reajuste para recompor pelo menos as perdas inflacionárias acumuladas desde 2016). Nesse aceno inicial, um ruidoso silêncio: nenhuma palavra sobre recomposição orçamentária das Universidades e Institutos Federais. Outra indignação nossa: nenhuma consideração sobre a situação de pessoas aposentadas, que tanto contribuíram para a educação. A educação resiste pela luta de quem nos antecedeu. Apontamos a insuficiência desse aceno. Diante da ausência de diálogo por parte do Governo, foi necessário exercer o direito constitucional da greve, fundamental instrumento de luta da classe trabalhadora.

“Como flor é pra florir, mas sem água, sol e tempo, que botão vai se abrir?” (provoca Emicida, na música Sementes).

Ações e Resultados da Greve. Deflagrada a greve no dia 15 de abril, pudemos nos dedicar, por meio de trabalho diário no comando local de greve e de participação no comando nacional de greve em Brasília, à construção desse movimento nacional, que chegou a contar com a adesão de 62 instituições paralisadas. As atividades envolveram levantamento e análise de dados sobre a conjuntura política, sobre orçamento e a disputa do fundo público, comparativo entre carreiras, atividades de mobilização, nacionais e locais, articulação de agendas com parlamentares, construção de espaços em meios de comunicação, para dar visibilidade ao movimento e à nossa pauta, entre outras. Foi fundamental o apoio que recebemos da sociedade, conforme pesquisa de opinião da Quaest Consultoria e Pesquisa; o apoio de parlamentares, manifestado com assinaturas colhidas em Carta Aberta das entidades representativas; o apoio da ANDIFES, do CONIF, de Conselhos Superiores, como o da UFJF; bem como o apoio do movimento estudantil, expresso em diversos convites para diálogo sobre a greve, com Diretórios, Centros Acadêmicos, Diretório Central de Estudantes, Grêmio Estudantil. A Greve conseguiu produzir avanços: 1) liberação de verbas de custeio para Universidades e Institutos Federais (em maio, R$347 milhões; em junho, anúncio de liberação adicional de R$ 400 milhões) e anúncio de investimento de R$5,5 bilhões através do PAC da Educação; 2) nova proposta de reajuste salarial linear – manutenção de zero por cento em 2024, 9% em janeiro de 2025 e 3,5% em maio 2026, vinculada a alteração de diferença de remuneração entre níveis distintos da carreira docente; 3) compromisso, sinalizado em junho pelo Governo, em revogar a Portaria 983/2020 (que impunha sobrecarga para o trabalho docente da carreira EBTT em sala de aula, dificultando produção de pesquisa e extensão) e a IN 66/2022 (que dificultava progressões docentes).

Desafios. As verbas de custeio liberadas/anunciadas são insuficientes. De acordo com a ANDIFES, seriam necessários R$2,5 bilhões para que as Universidades conseguissem encerrar 2024 sem déficit. Esse cenário impõe para muitas instituições corte na própria carne (bolsas estudantis, serviços terceirizados, etc.). A expansão anunciada não veio acompanhada de projeto com detalhamento técnico e do impacto nas despesas de pessoal. Como será essa expansão e quais desafios nos trará para a consolidação da educação? Como expandir a educação sem a necessária valorização das carreiras que a sustentam, sem garantir recursos necessários para a permanência estudantil? A proposta do governo para a “reconstrução do País”, na verdade, desafia a reconstrução da qual precisamos, pois nos impõe uma lógica de austeridade fiscal que normaliza o desfinanciamento da educação e da saúde, que prioriza os lucros de rentistas em detrimento de investimentos sociais. Sobre essa cartilha, neoliberal, que tem alavancado a extrema direita em todo o mundo, sempre nos alertou a professora de economia Maria da Conceição Tavares: “uma economia que diz que primeiro tem que estabilizar, depois crescer, para depois distribuir é uma falácia. Nem estabiliza, cresce aos solavancos e não distribui”.  Nossa greve cumpriu o importante papel de explicitar escolhas políticas, de disputá-las até o limite da correlação de forças nessa conjuntura e de apontar a necessidade de manter a mobilização para enfrentarmos os desafios que permanecem. Voltamos aos nossos postos de trabalho, compartilhando os impactos próprios de uma greve e com os efeitos causados por docentes que não participaram do movimento de defesa da educação pública e da valorização do trabalho, mas que se beneficiarão das suas conquistas. Ficamos com “a dor e a delícia de ser” o que somos: docentes que ousam lutar por melhores condições de trabalho e pelo direito à educação da atual e das futuras gerações. 

Contamos com vocês nesta luta!

Diretoria da APES