Gestores da UFJF e IF Sudeste MG falam à APES sobre grave situação orçamentária das Ifes de Juiz de Fora
Instituições federais de ensino têm denunciado a grave situação orçamentária imposta pelo governo Bolsonaro, que ameaça parar completamente o funcionamento de todos os serviços prestados por universidades e institutos. Mesmo com o importante trabalho prestado por essas instituições durante a pandemia, disponibilizando pesquisas, laboratórios, hospitais universitários e seu corpo docente, técnico estudantil no combate à Covid-19 e proteção da população, o cenário atual imposto pela falta de verbas pode fazer essas instituições fecharem as portas no segundo semestre deste ano.
Apesar de manter em funcionamento os serviços essenciais no combate à crise sanitária e as demais atividades de modo remoto, protegendo assim sua própria comunidade e toda a sociedade com medidas de isolamento social, o governo pressiona tais instituições com um retorno presencial forçado, sem recursos para adaptar as instituições às condições seguras de funcionamento, sem ampla vacinação, sem controle da pandemia no país.
De acordo com dados informados pelo vice-presidente da Andifes e reitor da UFJF, professor Marcus David, o Projeto de Lei Orçamentária enviado pelo governo previa um corte de 16,5% nas despesas discricionárias das universidades, comparado ao orçamento de 2020. Entretanto, entre a tramitação do PL no Congresso e a sanção do presidente Jair Bolsonaro, o corte foi ampliado. Segundo levantamentos feitos pelo ANDES-SN, o corte na LOA de 2021 impacta o já reduzido orçamento destinado para o ensino superior no país, que é de R$4,5 bilhões, valor 18,2% menor que o de 2020, sem a correção da inflação. A medida afetará as 69 instituições de ensino vinculadas à União, com graus diferentes e sem critério conhecido. Do corte de R$1 bilhão, por exemplo, R$177,6 milhões atingem a assistência estudantil. Somando-se ao corte, o Decreto 10.686/21 – que dispõe sobre as dotações orçamentárias primárias discricionárias-, bloqueou R$2,7 bilhões do orçamento do Ministério da Educação (MEC), atingindo as universidades federais em mais 13,89%.
Segundo o pró-reitor de administração do IF Sudeste MG, Isaac Euzébio de Faria, o corte total na Rede Federal foi de R$ 770 milhões, comparando a LOA de 2020 com a sancionada em 2021. Parte desse valor (R$ 273 milhões) que corresponde a 13,8% está bloqueado, podendo ainda, ser revertido.
UFJF e IF Sudeste MG
As condições das instituições federais de Juiz de Fora não escapam desta realidade, que é, infelizmente, nacional. Segundo matéria publicada pela UFJF, com orçamento para custeio em 2021 por volta de R$ 59,1 milhões e dotação orçamentária para capital em torno de R$ 3,3 milhões, a instituição sofre com corte de verbas para manutenção, que chega perto de 24%, em relação a 2020, e a 44% em relação a 2016. Segundo Marcus David, na UFJF, o corte total será de 21%, o que inviabiliza o pagamento de várias bolsas na área de ensino, pesquisa, extensão e cultura e na área administrativa. Quadro que se torna ainda mais grave na pandemia, quando as universidades precisam de aportes adicionais de recursos, como ressalta o reitor.
No IF Sudeste MG, conforme o reitor André Diniz e o pró-reitor Isaac Euzébio,o corte foi de 26,55%, aproximadamente R$ 12,8 milhões. Isso equivale um pouco mais ao orçamento de 2011, para uma instituição que ampliou sua infraestrutura e sua oferta de vagas e cursos. Segundo Isaac Euzébio, a redução mais expressiva foi nos investimentos, 32,3% do total estimado. Além disso, o atraso na aprovação da PLOA, que se deu apenas no final de abril, gerou desgastes na administração e redução dos valores repassados mensalmente.
As duas instituições sofrem, ainda, com bloqueios orçamentários. No IF Sudeste MG, há um bloqueio de 14,36% da LOA/ 2021, sendo a maior parte, 30,5%, na ação de custeio e 100% de uma emenda parlamentar de investimento, segundo Isaac Euzébio. Na UFJF, até essa quarta-feira, 19 de maio, cerca de R$ 26 milhões destinados ao orçamento de custeio para manutenção estavam bloqueados pelo Governo Federal. O montante equivale a cerca de 44% do total esperado de R$ 59.138.189. Em matéria publicada pela Apes, o reitor da UFJF afirmava que o bloqueio na instituição significa que a universidade só conseguiria funcionar até agosto.
Impactos e ajustes
Com esses cortes, a UFJF adotou medidas para enfrentar a situação, como corte de 300 postos terceirizados, corte de 700 bolsas de extensão e graduação, redução no valor das bolsas restantes, corte nos recursos de apoio à pós-graduação e diminuição de aquisições de manutenção.O orçamento restrito já representa graves dificuldades com a manutenção de bolsas de assistência e com pagamentos de fornecedores. E caso o quadro não seja revertido, há riscos para diversas frentes de trabalho. Segundo a instituição, a UFJF pode chegar a paralisar as ações de enfrentamento à Covid-19, reduzir projetos de apoio à comunidade, interromper atividades de pesquisa e enfrentar mais dificuldades com projetos de pesquisa continuados.
No IF Sudeste, segundo Isaac Euzébio, o maior impacto ocorreu na impossibilidade de manter os valores da assistência estudantil neste ano, comparado ao disponibilizado no ano passado, pois houve uma redução da LOA 2020 para a de 2021 de 14,97% (equivalente a R$ 1.036.852). Segundo André Diniz, a Reitoria do IF irá repassar aos campi 500 mil reais para a Assistência Estudantil. Entretanto, o valor não será suficiente, quando comparado com o que foi realizado em 2020. Com isso, haverá diminuição nas bolsas de auxílio emergencial, internet e aquisição de equipamentos, que são concedidos aos alunos neste momento de pandemia e de Ensino Remoto Emergencial (ERE).
Segundo o pró-reitor, no âmbito de funcionamento, o IF Sudeste tentará não reduzir os serviços terceirizados, mas se o cenário não for revertido, a instituição prevê uma redução de 15 a 20%. Os cortes e bloqueios, porém, têm consequências graves não apenas para os serviços, mas também em áreas de custeio, gerando sérios problemas para atuação dos servidores e a vida escolar dos estudantes. O pró-reitor Isaac Euzebio avalia que esta situação se torna ainda mais crítica diante do cenário atual, marcado pela pandemia, “que exige um investimento maior nos contratos de limpeza, materiais e adequações nos espaços para garantir a segurança de retorno as atividades presenciais”. Para um retorno presencial, o custo para a rede federal é de aproximadamente R$ 126 milhões. “Em 2022, a se repetir este orçamento, com a presença física nas escolas, não teremos a mínima condição de funcionamento.”
Outro problema relatado pelo pró-reitor aponta diz respeito aos custos com as obras em andamento. Para sua continuidade, “os contratos estão necessitando de aditivos e reequilíbrio econômico-financeiro em razão dos aumentos dos insumos da construção civil, causados pela pandemia”, explica.
Em síntese, segundo o pró-reitor, se não houver liberação do crédito que está bloqueado, há o comprometimento do funcionamento institucional, impactando principalmente na assistência estudantil dos alunos e nas atividades de ensino, pesquisa e extensão, que vem desenvolvendo vários projetos para a comunidade, inclusive no combate à Covid19.
Análise
Para André Diniz, a gestão correta e otimizada dos recursos sempre foi feita. Entretanto, ele afirma que a gestão orçamentária terá um limite. Segundo a análise do reitor do IF Sudeste MG, alguns setores foram privilegiados na aprovação do orçamento, que se tornou “uma peça de ficção, já se sabia que novos cortes seriam necessários para torná-lo factível e não deixar o governo cair em crimes de responsabilidade. Os vetos mais recentes ao orçamento, portanto, cumpriram este papel, mas tirando do nosso IF, por exemplo, uma possibilidade de emenda parlamentar de 250 mil reais que encontra-se bloqueada, 24,3 milhões da rede foi vetado e, posteriormente, 273 milhões foram bloqueados”, afirma.
Como explica Marcus David, essa situação vivenciada pelas instituições em 2021 não é um fato isolado, mas é produto de um processo que se agravou com a aprovação da emenda constitucional do Teto dos Gastos em 2016. Como lembra o reitor, “naquele momento, houve várias manifestações apontando que a medida causaria uma situação de instabilidade no funcionamento do Estado, que seria crescente a cada ano, até chegarmos a esta situação de asfixia orçamentária desse grande patrimônio da sociedade brasileira, que é o conjunto das Universidades públicas”.
Reações
O ANDES-SN se soma à luta de todas as entidades educacionais, sindicais, estudantis e científicas, para que ocorra uma urgente recomposição dos recursos alocados para a Educação, especialmente para as instituições de ensino e pesquisa. Esta foi uma das pautas do 19 de maio, e também está presente em toda jornada de lutas que se iniciou neste importante Dia de Luta e Resistência em Defesa da Educação Pública.
No âmbito da Andifes, uma grande campanha junto à mídia tem obtido algum êxito, com abertura de espaço na mídia nacional para esta pauta. Várias ações políticas têm sido feitas junto ao Ministério da Educação, com reuniões permanentes com as equipes do MEC e uma ação organizada com conjunto dos reitores para atuação junto ao parlamento. Nesta ação, cada reitor procura atuar junto às bancadas dos seus estados, na tentativa de reverter esse cenário.
Em sua posse em Brasília, o reitor do IF Sudeste André Diniz aproveitou a oportunidade para tratar do assunto com a Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (Setec) e solicitar apoio na assistência estudantil e também para a continuidade das obras do Instituto para que não haja paralisação. Segundo Isaac Euzébio, a SETEC se mostrou sensível, mas infelizmente apontou que também estão com dificuldades para apoiar a Rede, mas que analisará os pleitos.
Segundo o pró-reitor do IF, Isaac Euzébio, “o Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif), tem tratado do assunto também diretamente com o MEC, com o intuito de reverter o cenário, que impossibilita o planejamento e funcionamento das instituições, principalmente se houver o retorno híbrido das atividades institucionais. Nesse sentido, em levantamento realizado pelo Fórum de Planejamento (Forplan) do Conif, no âmbito do IF Sudeste MG, constatamos déficit orçamentário para continuidade das atividades para um retorno no segundo semestre letivo”.
Diante desse cenário, André Diniz aponta dois caminhos: a urgência de se explicitar as consequências dessa postura do governo diante das instituições federais de ensino, que tanto auxiliam a sociedade; e lutar por mais recursos. “Para que essa política seja revertida, a luta precisa ser em todas as frentes: na gestão, no relacionamento com a secretaria de educação profissional e tecnológica, junto aos sindicatos, as organizações estudantis, etc.”