Sobre o subitem “Condições de trabalho durante a pandemia”, 15,6% dos/das docentes não possuem computador adequado para seu trabalho docente. Apesar da maioria ter acesso à internet por wi-fi, via cabo ou fibra ótica na própria residência, há docentes que só têm acesso por dados móveis ou em locais públicos de difícil acesso. 26,7% consideram que seu equipamento não é adequado para seu trabalho remoto, e 25% divide este equipamento com outra pessoa no domicílio. 24,4% não dispõe de local de trabalho para realização das tarefas remotas em sua moradia. Quase a metade dos/das docentes (46,7%) respondeu “Não” ou “Outro” para a questão: A disposição da sua residência se adequou satisfatoriamente às modificações necessárias para a realização das tarefas inerentes ao ensino remoto?
É possível identificar um grande número de atividades que estão sendo desenvolvidas pelos docentes e pelas docentes no período de isolamento social e trabalho remoto. Esta questão também possibilitava a marcação de mais de uma alternativa. Do universo pesquisado até o momento, a maioria continua a exercer atividade de ensino (97,8%), pesquisa (84,4%), orientação (82,2%), atividades administrativas (66,7%), extensão (44,4%), Grupo de Estudos (42,2%) e cursos de formação (48,9%), passando também a realizar atividades de Lives (53,3%).Uma lista com diversas outras atividades ainda foram mencionadas, como um grande número de reuniões (com direção e pais de alunos, especialmente), atividades de representação sindical e participação em comissões, entre outras.
O contato com discentes orientandos/as ou inscritos/as em disciplinas antes da implementação do ensino remoto emergencial foi realizado pela maioria dos/das docentes (82,2%). Os motivos principais desse contato anterior ao ERE foram para passar material de estudo, dar continuidade ao trabalho de pesquisa e de orientação e para saber sobre as condições de vida no período da pandemia, entre outras.
Em relação ao impacto da pandemia no tempo disponível para o desenvolvimento de atividades docentes, 91,1% afirmou ter menos tempo, porque agregou mais tarefas.
Ao ministrar aula no período especial remoto, 97,8% dos/das docentes tiveram que preparar material diferenciado em relação ao material das aulas presenciais. Entre esses materiais, foram destacados: produção de vídeos, produção de áudios, digitalização de textos, organização de biblioteca virtual, preparação de tutoriais, apostilas e manuais, preparação de slides para aulas assíncronas, recursos avaliativos adequados ao ERE, adaptação de atividades práticas para serem realizadas pelos discentes com autonomia e em suas residências e revisão de bibliografia, entre outros.
Do universo pesquisado, 57,8% não tinha experiência prévia com o ensino remoto.
Ao ter que ministrar aulas no período remoto emergencial, docentes identificaram diversas dificuldades ao trabalhar nesta modalidade de ensino. Na pesquisa, foram destacadas dificuldades em: interação pessoal com discentes; manter aulas de qualidade e de forma dialógica; aprofundar discussões; preparar e editar vídeos; realizar avaliações e dar feedbacks; saber sobre a realidade da vida de cada discente; explicar conteúdos e conceitos; encontrar e disponibilizar materiais didáticos adequados.
Ainda sobre as dificuldades em trabalhar com o ensino remoto, destacam-se ainda a falta de formação com a educação por meio virtual, as dificuldades em usar plataformas de ensino, softwares e aplicativos e o desconhecimento sobre a dinâmica das aulas online.
Na adaptação do ensino presencial para o remoto, mais da metade dos/das docentes tiveram que substituir materiais ou retirar conteúdo das disciplinas na ausência de disponibilidade virtual de materiais planejados para o ensino presencial, e 80% consideraram que esta solução trouxe algum prejuízo ao processo de ensino-aprendizado.
Ainda sobre esta questão, docentes relataram falta de participação dos discentes (o que um docente chamou de uma “falsa presença" (conecta, câmera desligada, mas não permanece no ambiente); cansaço e dificuldade gerados pela leitura virtual dos materiais por parte dos discentes; falta de acesso dos discentes à livros impressos; defasagem da biblioteca online da UFJF; dificuldade na adaptação da carga horária da disciplina; comprometimento das vivências práticas de disciplinas.
Docentes também apontaram para as condições sociais do desenvolvimento das atividades. Relataram que o cenário de pandemia, de crise econômica e de emprego é desmotivador para discentes, e identificaram a exclusão das crianças pobres do processo de ensino remoto, pois suas famílias não têm condições de acompanhá-las.
Para garantir melhores condições de trabalho em seu domicílio, praticamente todos/as os/as docentes pesquisados/das tiveram que realizar algum tipo de aquisição para atender às condições de trabalho por meio remoto (com exceção de um docente que não respondeu a esta questão). Assim, docentes tiveram que adquirir equipamentos de comunicação, mobiliário de escritório, planos de internet que melhorassem sua capacidade de conexão, entre outros custos.
Nesse período de trabalho remoto, 64,4% dos/das docentes tiveram receio de sofrer consequências administrativas por não realizar atividades no período especial. Sobre esta questão, alguns docentes relataram que este receio estaria vinculado às sanções do governo federal; em outros casos, houve relatos de pressões institucionais internas e assédio moral. Além disso, alguns se sentiram pressionados pela própria sociedade, e até de círculos próximos, como amigos e familiares, que consideram que o trabalho ficou menor e de baixa qualidade, gerando desgastes emocionais. Docentes também relataram, neste ponto, que o processo de implementação do Ensino Remoto Emergencial foi realizado “de forma apressada”, sem formação prévia de docentes e discentes. Há relatos de que a própria cobrança institucional continua a operar, de forma velada ou explícita, mesmo com a implementação do ensino remoto emergencial, e de que o registro das atividades nas plataformas criou mais um mecanismo de controle e vigilância sobre o docente, aumentando a pressão e a cobrança e retirando sua autonomia.
Ao serem perguntados/das como os/as docentes se sentiram durante a pandemia, os principais problemas emocionais e de saúde mental apresentados foram angústia (62,2%), ansiedade (57,8%), tristeza (55,6%), irritação (53,3%), insônia (48,9%), desamparo (26,7% e agitação (33,3%).
Segundo as respostas obtidas, foi possível perceber que tais condições emocionais afetaram o trabalho docente de diversas maneiras, entre elas, perda de concentração, perda de disposição, excesso de autocobrança e sentimento de frustração, seja pela dificuldade em realizar o trabalho esperado ou pela falta de interação por parte de discentes.
O período de trabalho remoto, especialmente o de ensino remoto emergencial, teve grande impacto sobre a atividade como docente. Entretanto, muitos relataram que este momento apenas deixou ainda mais evidente e agudo o já vivenciado descaso estrutural com a educação e a desvalorização e precarização do trabalho docente.
Muitos mencionaram que esta modalidade de ensino torna a atividade docente desgastante e desmotivadora pela falta de interação com os discentes, pela dificuldade em dar apoio a eles acerca de questões pessoais e educacionais e pela falta de contato presencial com as turmas. Neste sentido, é possível perceber que muitos se preocupam e se esforçam, neste momento, para “manter o brilho nos olhos dos alunos, mesmo não os vendo”, como relatou um dos respondentes.
Ainda sobre este ponto, muitos relataram dificuldades ou impossibilidade em adaptar conteúdos, materiais, planos de trabalho, projetos de pesquisa e de extensão para a modalidade remota. Além disso, o tempo dedicado a preparação de aulas em uma modalidade totalmente diferente da presencial, o tempo exigido pela atuação nas plataformas e nos atendimentos aos/às docentes têm comprometido a possibilidade de desenvolvimento de outras atividades e projetos.
Para grande parte dos/das entrevistados/as, o período da pandemia e especialmente o de ensino remoto emergencial trouxe reflexões sobre a função das Universidades Públicas e dos Institutos Federais e da Educação. Muitos temem que a prática desta modalidade possa precarizar ainda mais os cursos presenciais e ampliar a oferta de cursos a distância, tornando o emergencial algo permanente. Os diversos problemas, dificuldades e limitações da prática do ensino remoto revelaram, segundo os respondentes, a importância da defesa do ensino presencial, ressaltado pelos entrevistados como insubstituível e necessário.
Docentes também apontaram que, neste momento, as instituições federais de ensino deveriam ter centrado sua atuação para encontrar soluções para os dilemas sociais e de saúde colocados pela pandemia, ao invés de atender demandas que não coadunam com a função pública das universidades e institutos. Alguns relataram também que todo o esforço, criatividade e compromisso para atuar neste momento mostrou a importância e a função dos/das docentes das instituições públicas de ensino - mas também sua desvalorização e falta de condições de trabalho.
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O último item do questionário aplicado pela APES referiu-se à Percepção docente sobre as condições de vida e estudo dos discentes no período da pandemia. Neste subitem, 77,8% dos professores e professoras tiveram conhecimento sobre as condições de vida de alguns de seus discentes no que tange às condições de trabalho.
Na avaliação dos/das entrevistados/as, 71,1% consideram que os/as discentes têm apenas “parcialmente” acesso à internet de qualidade e a equipamentos apropriados para o processo de ensino de aprendizagem remoto, e 22,2% consideram que eles não têm.
81,8% consideram que o ensino remoto emergencial não inclui todos os discentes em período de conclusão do curso. Neste item, foram relatadas as diversas desigualdades enfrentadas pelos discentes em relação aos recursos e condições de acesso às tecnologias, condições familiares, compartilhamento de equipamentos com outros membros da família e relatos de discentes que tiveram que começar a trabalhar durante a pandemia, devido a queda da renda familiar neste momento. A suspensão de atividades de estágio e a inviabilidade de realização de atividades práticas também foram mencionadas como elementos que afetaram discentes em período de conclusão de curso. Neste sentido, um/uma dos/das participantes relatou que não houve clareza se os recursos de segurança para a continuidade dos estágios seriam de responsabilidade das empresas concedentes dos estágios ou da UFJF.
Também foi identificado o prejuízo aos discentes com deficiência, pois, segundo o relato de um dos docentes participantes da pesquisa, o ensino remoto emergencial adota procedimentos padronizados que não contribuem para um trabalho docente voltado para um olhar inclusivo.
Sobre os impactos que as condições de estudo, como ofertadas no período da pandemia, têm sobre o processo de ensino aprendizagem, a maioria dos relatos apontam a queda da qualidade do ensino, limitação da formação discente, prejuízos relativos a ausência de um processo dialógico, ausência de uma formação humana baseada na sociabilidade e na troca, impossibilidade de aprofundamento e consequente superficialidade dos conteúdos a serem ensinados e aprendidos.
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